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Música Brasileira
Natan Zach
sexta-feira, setembro 30, 2005
Fahrenheit 451
quinta-feira, setembro 29, 2005
O Vento
Posso ouvir o vento passar... assistir a onda bater
mas o estrago que faz... a vida é curta pra ver...
Eu pensei...
Um século, um mês, três vidas e mais um passo pra trás?
Por que será?
Vou pensar.
- Como pode alguém sonhar o que é impossível saber?
- Não te dizer o que eu penso já é pensar em dizer...
E isso, eu vi, o vento leva!
- Não sei... mas sinto que é como sonhar...
Que o esforço pra lembrar é a vontade de esquecer...
E isso por que? Diz mais!
então o que resta é chorar e talvez, se tem que durar,
vem renascido o amor bento de lágrimas.
E como será?
O vento vai dizer lento o que virá
e se chover demais a gente vai saber,
no claro de um trovão,
se alguém depois sorrir em paz.
quarta-feira, setembro 28, 2005
In Poemas Inconjuntos
Que uma pedra ou uma planta.
Dizes-me: sentes, pensas e sabes
Que pensas e sentes.
Então as pedras escrevem versos?
Então as plantas têm idéias sobre o mundo?
Sim: há diferença.
Mas não é a diferença que encontras;
Porque o ter consciência não me obriga a ter teorias sobre as cousas:
Só me obriga a ser consciente.
Se sou mais que uma pedra ou uma planta?Não sei.
Sou diferente.Não sei o que é mais ou menos.
Ter consciência é mais que ter cor?
Pode ser e pode não ser.
Sei que é diferente apenas.
Ninguém pode provar que é mais que só diferente.
Sei que a pedra é a real, e que a planta existe.
Sei isto porque elas existem.
Sei isto porque os meus sentidos mo mostram.
Sei que sou real também.
Sei isto porque os meus sentidos mo mostram,
Embora com menos clareza que me mostram a pedra e a planta.
Não sei mais nada.
Sim, escrevo versos, e a pedra não escreve versos.
Sim, faço idéias sobre o mundo, e a planta nenhumas.
Mas é que as pedras não são poetas, são pedras;
E as plantas são plantas só, e não pensadores.
Tanto posso dizer que sou superior a elas por isto,
Como que sou inferior.
Mas não digo isso: digo da pedra, "é uma pedra",
Digo da planta, "é uma planta",
Digo de mim, "sou eu".
E não digo mais nada. Que mais há a dizer?
Fernando Pessoa
terça-feira, setembro 27, 2005
O Temor Combate-se com a Esperança
Estabelece equilíbrio, pois, entre a esperança e o temor; sempre que houver completa incerteza, inclina a balança em teu favor: crê no que te agrada. Mesmo que o temor reuna maior número de sufrágios, inclina-a sempre para o lado da esperança; deixa de afligir o coração, e figura-te, sem cessar, que a maior parte dos mortais, sem ser afetada, sem se ver seriamente ameaçada por mal algum, vive em permanente e confusa agitação. É que nenhum conserva o governo de si mesmo: deixa-se levar pelos impulsos, e não mantém o seu temor dentro de limites razoáveis. Nenhum diz: - Autoridade vã, espírito vão: ou inventou, ou lho contaram. Flutuamos ao mínimo sopro. De circunstâncias duvidosas, fazemos certezas que nos aterrorizam. Como a justa medida não é do nosso feitio, instantaneamente uma inquietude se converte em medo.
A palavra impossível
A vida que não se troca por palavras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
As vozes que só em mim são verdadeiras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
A impossível palavra verdade.
Deram-me o silêncio como uma palavra impossível,
Nua e clara como o fulgor duma lâmina invencível,
Para eu guardar dentro de mim,
Para eu ignorar dentro de mim
A única palavra sem disfarce
-A palavra que nunca se profere.
Adolfo Casais Monteiro in: http://conversamos.blogspot.com
segunda-feira, setembro 26, 2005
O Segredo dos Seres e do Mundo
"Sentia-me à vontade em tudo, isso é verdade, mas ao mesmo tempo nada me satisfazia. Cada alegria fazia-me desejar outra. Ia de festa em festa. Acontecia-me dançar noites a fio, cada vez mais louco com os seres e com a vida. Por vezes, já bastante tarde, nessas noites em que a dança, o álcool leve, o meu desenfreamento, o violento abandono de cada qual, me lançavam para um arroubo ao mesmo tempo lasso e pleno, parecia-me, no extremo da fadiga e no lapso de um segundo, compreender, enfim, o segredo dos seres e do mundo. Mas a fadiga desaparecia no dia seguinte e, com ela, o segredo; e eu atirava-me outra vez."
Albert Camus in: A Queda
domingo, setembro 25, 2005
A Liberdade de Escolha
"Realmente, se um dia de fato se descobrisse uma fórmula para todos os nossos desejos e caprichos - isto é, uma explicação do que é que eles dependem, por que leis se regem, como se desenvolvem, a que é que eles ambicionam num caso e noutro e por aí fora, isto é uma fórmula matemática exata - então, muito provavelmente, o homem deixaria imediatamente de sentir desejo. Pois quem aceitaria escolher por regras? Além disso, o ser humano seria imediatamente transformado numa peça de um orgão ou algo do gênero; o que é um homem sem desejos, sem liberdade de desejo e de escolha, senão uma peça num orgão?"
Fiodor Dostoievski
quinta-feira, setembro 22, 2005
O Paradoxo do Outro
O homem só pode viver com os que se lhe assemelham. E ao mesmo tempo não pode viver com eles, porque não suporta que alguém se lhe assemelhe eternamente.
Quando duas pessoas estão inteiramente satisfeitas uma com a outra, podemos ter quase sempre a certeza de que estão ambas enganadas."
Johann Wolfgang von Goethe
Íris
Pois quando acordei tinhas vindo e partido.
Apenas algumas flores permaneceram -
Flores que não podiam sequer dizer quem eram...
E uma fragrância vaga e suave no ar.
Esta noite tenho de sonhar um sonho mais longo
Para que as flores falem
E a sua fragrância estenda uma trêmula ponte
Entre nós.
P. S. Rege
O benfeitor
Viu ao longe os muros de uma cidade circular e caminhou na sua direcção. E quando chegou próximo, ouviu no seu interior o trilho de alegres passadas, riso de bocas alegres e som alto de muitos alaúdes. Bateu e alguns dos guardas abriram-lhe os portões. Só para Ele.
Avistou uma casa de mármore, com sólidos pilares em frente, feitos do mesmo material. Estavam decorados com coroas de flores e por dentro e por fora da casa havia archotes de cedro. E ele entrou.
Quando atravessou o salão de calcedônia e o salão de jaspe e chegou ao grande salão de festas, viu estendido num sofá cor de algas vermelhas alguém cujos cabelo estava coroado por rosas rubras e cujos lábios estavam vermelhos de vinho. ele foi por detrás, tocou-lhe no ombro e disse-lhe:
«Por que vives desta maneira?»
E o jovem virou-se e reconheceu-O. Pensou um pouco e disse-Lhe:
«Mas eu estive leproso em tempos e tu curaste-me. De que outra maneira haveria de viver?»
Ele abandonou a casa e voltou novamente para a rua.
Passado um bocado avistou uma mulher cuja face e o vestuário estavam pintados e que trazia nos pés ajaezados e pérolas. E, por detrás dela, vinha furtivo como um caçador, um homem jovem que vestia um manto com duas cores, nesse preciso instante a face da mulher era clara e honesta, como a de uma deusa, mas os olhos do jovem estavam cobertos de luxúria.
Então, Ele correu rapidamente e tocou a mão do jovem e disse-lhe:
«Porque estás a olhar para essa mulher dessa maneira?»
O rapaz virou-se e reconheceu-O. E disse:
«Mas eu fui cego em tempos e tu deste-me a vista. Para que outra coisa deveria olhar?»
Ele correu para a mulher e tocou-lhe no vestuário pintado e disse-lhe:
«Não existe outro caminho que não seja o caminho do pecado?»
A mulher virou-se e reconheceu-O. Riu e disse:
«Mas tu perdoaste-me os pecados e este caminho é um caminho agradável.»
Ele saiu da cidade.
E quando saiu de lá, avistou, na beira da estrada, um outro jovem que estava a chorar.ele caminhou na sua direcção e tocando-lhe nas longas madeixas de cabelo perguntou-lhe:
«Porque choras?»
E o rapaz olhou para cima e reconheceu-O. Pensando um instante, respondeu-lhe:
«Mas eu estive morto em tempos e tu tiraste-me da morte. Que mais posso eu fazer do que chorar?»
quarta-feira, setembro 21, 2005
Simetria
O Homem é um Animal Irracional.
terça-feira, setembro 20, 2005
...Uma ausência
Sinto-me, sem sentir, todo abrasado o rigoroso fogo que me alenta;
O mal, que me consome, me sustenta;
O bem, que me entretém, me dá cuidado.
António Barbosa Bacelar
Outro rio...
Olhar o rio feito de tempo e água e recordar que o tempo é outro rio, saber que nos perdemos como o rio e que os rostos passam como a água.
Sentir que a vigília é outro sonho que sonha no sonhar e que a morte que teme a nossa carne é essa mesma morte de cada noite, e que se chama sonho.
Ver no dia ou no ano um símbolo dos dias do homem e dos seus anos,
converter a afronta dos anos numa música, num rumor e num símbolo,
ver na morte o sonho, no acaso uma triste riqueza,
assim é a poesia também imortal e pobre.
A poesia regressa como a aurora e o acaso.
Às vezes em certas tardes um rosto observa-nos desde o fundo de um espelho,
a arte deve ser como esse espelho que nos revela o nosso próprio rosto.
Contam que Ulisses, farto de maravilhas,
chorou de amor ao avistar Itaca verde e humilde.
A arte é essa Itaca de um verde eterno, e não de maravilhas.
Também é como o rio interminável que passa e fica
e é cristal de um mesmo Heraclito inconstante, que é ele mesmo e é outro,
como o rio interminável.
Jorge Luis Borges
Criar banalidades...
...não sei o que é banalidade... Talvez o que tenha aparência de banal, na verdade, resguarde uma essência imprescindível. Para mim nada é banal, tudo tem importância e merece atenção, um certo desvio de olhar... Sei lá! Acredito em paradas, retornos, olhar de novo com outro olhar... Não me controlo... Sinto pena daqueles que se controlam em demasia...
"Um pouco de trabalho, repetido trezentas e sessenta e cinco vezes, dá trezentas e sessenta e cinco vezes um pouco de dinheiro, isto é, uma soma enorme. Ao mesmo tempo, a glória está feita. Do mesmo modo, uma porção de pequenos gozos compõem a felicidade. Criar uma banalidade, é o gênio.
Charles Baudelaire
segunda-feira, setembro 19, 2005
Na ilha por vezes habitada.
Na ilha por vezes habitada do que somos,
há noites, manhãs e madrugadas em que não precisamos de morrer.
Então sabemos tudo do que foi e será.
O mundo aparece explicado definitivamente
e entra em nós uma grande serenidade, e dizem-se as palavras que a significam.
Levantamos um punhado de terra e apertamo-la nas mãos.
Com doçura.
Aí se contém toda a verdade suportável:
o contorno, a vontade e os limites.
Podemos então dizer que somos livres,
com a paz e o sorriso de quem se reconhece
e viajou à roda do mundo infatigável,
porque mordeu a alma até aos ossos dela.
Libertemos devagar a terra onde acontecem milagres
como a água, a pedra e a raiz.
Cada um de nós é por enquanto a vida.
Isso nos baste.
José Saramago
quarta-feira, setembro 14, 2005
Odeio os indiferentes
"Odeio os indiferentes. Como Frederico Hebbel, acredito que ‘viver é tomar partido’. Não podem existir apenas homens, os estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão e partidário. Indiferença é abulia, é parasitismo, é covardia, não é vida. Por isso, odeio os indiferentes. A indiferença e o peso morto da história. É a bola de chumbo para o inovador, é a matéria inerte na qual freqüentemente se afogam os entusiasmos mais esplendorosos. A indiferença atua poderosamente na história. Atua passivamente, mas atua. É a fatalidade, é aquilo com o que não se pode contar; é aquilo que confunde os programas, que destrói os planos mais bem construídos. É a matéria bruta que se rebela contra a inteligência e a sufoca. O que acontece, o mal que se abate sobre todos, o possível bem que um ato heróico (de valor universal) pode gerar, não se deve tanto à iniciativa dos poucos que atuam, quanto a indiferença de muitos. O que acontece não acontece tanto porque alguns o queiram, mas porque a massa de homens abdica de sua vontade, deixa de fazer, deixa enrolarem os nós que, depois, só a espada poderá cortar; deixa promulgar leis que, depois, só a revolta fará anular; deixa subir ao poder homens que, depois, só um sublevação poderá derrubar. Os fatos amadureceram na sombra porque mãos, sem qualquer controle a vigiá-las, tecem a teia da vida coletiva, e a massa não sabe, porque não se preocupa com isso. Os destinos de uma época são manipulados de acordo com visões restritas, os objetivos imediatos, as ambições e paixões pessoais de pequenos grupos ativos, e a massa dos homens ignora, porque não se preocupa. Por isso, odeio os indiferentes."
O Perdão e a Promessa
"Se não fôssemos perdoados, eximidos das consequências daquilo que fizermos, a nossa capacidade de agir ficaria por assim dizer limitada a um único ato do qual jamais nos recuperaríamos; seríamos para sempre as vítimas das suas consequências, à semelhança do aprendiz de feiticeiro que não dispunha da fórmula mágica para desfazer o feitiço. Se não nos obrigássemos a cumprir as nossas promessas não seríamos capazes de conservar a nossa identidade; estaríamos condenados a errar desamparados e desnorteados nas trevas do coração de cada homem, enredados nas suas contradições e equívocos - trevas que só a luz derramada na esfera pública pela presença de outros que confirmam a identidade entre o que promete e o que cumpre poderia dissipar. Ambas as faculdades, portanto, dependem da pluralidade; na solidão e no isolamento, o perdão e a promessa não chegam a ter realidade: são no máximo um papel que a pessoa encena para si mesma."
terça-feira, setembro 13, 2005
Tempo...
Se pudesses voltar atrás
Emendar todos os erros
E tornar o passado perfeito
Será que o farias?
Se soubesses da despedida
Abririas ainda os braços?
Emendarias o passado
Para modificar o presente?
Conjugarias o verbo ser
Mesmo sendo hoje ausente?
Arriscarias a partida
Se soubesses da chegada?
Encandescente