diante de mim,
eu,
pecador,
me confesso
de ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau que vão ao leme
Me confesso o bom e o mau que vão ao leme
da nau nesta deriva em que vou.
Me confesso possesso das virtudes teologais,
Me confesso possesso das virtudes teologais,
que são três,e dos pecados mortais,
que são sete, quando a terra não repete que são mais.
Me confesso o dono das minhas horas.
O das facadas cegas e raivosas,
Me confesso o dono das minhas horas.
O das facadas cegas e raivosas,
e o das ternuras lúcidas e mansas.
E de ser de qualquer modo andanças do mesmo todo.
Me confesso de ser charco e luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco que atira setas
E de ser de qualquer modo andanças do mesmo todo.
Me confesso de ser charco e luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco que atira setas
acima e abaixo da minha altura.
Me confesso de ser tudo que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.
Me confesso de ser Homem.
De ser um anjo caído do tal céu que Deus governa;
de ser um monstro saído do buraco
Me confesso de ser tudo que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.
Me confesso de ser Homem.
De ser um anjo caído do tal céu que Deus governa;
de ser um monstro saído do buraco
mais fundo da caverna.
Me confesso de ser eu.
Eu,
Me confesso de ser eu.
Eu,
tal e qual como vim para dizer
que sou eu aqui,
diante
de
mim!
Miguel Torga
Miguel Torga
Um comentário:
Oi Sol, legal ver aqui um texto do Torga. O "descobri" quase por acaso, há uns anos, através de um poema...Brasil. Em Livro de Horas, ele que não gostava de ambiguidades no escrever, mostra a ambiguidade do homem e dele mesmo. Lindo texto. Beijokas!
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