"Metade da gente do mundo
ama
a outra metade,
metade da gente
odeia
a outra metade.
Por causa desta e daquela metade terei eu de vaguear e me transformar incessantemente como chuva no seu ciclo, terei eu de dormir entre rochas, tornar-me áspero como os troncos das oliveiras, e ouvir a lua uivar para mim,e camuflar o meu amor com receios, e brotar como erva assustada entre os carris do caminho de ferro, e viver submerso como uma toupeira, e quedar-me com raízes mas sem ramos,e não sentir a minha face contra a face de anjos, e amar na primeira caverna, e casar com a minha mulher sob uma abóbada de vigas que sustentam a Terra,e expressar a minha morte, sempre até ao último sopro e às últimas palavras e sem nunca compreender, e colocar mastros sobre o telhado da minha casa e um abrigo anti aéreo debaixo dela. E ir apenas para regressar e passar por todos os lugares – gato, pau, fogo, talhante, entre o cabrito e o anjo da morte?
Metade da gente
ama,
metade da gente
metade da gente
odeia.
E qual é o meu lugar entre tais iguais metades, e por que fenda verei eu o bairro de casas brancas dos meus sonhos e as pegadas nuas na areia ou, pelo menos, o lenço da mulher que acena junto às dunas?"
Yehuda Amichai - poeta israelita in: Rua da Judiaria
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