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Música Brasileira

"Não é bom para o homem estar só mas ele está só, mesmo assim, ele espera e está só, ele adia e está só, só ele sabe que mesmo adiando chegará."
Natan Zach

domingo, dezembro 11, 2005

Tentações do apocalipse

Não é de poesia que precisa o mundo.
Aliás, nunca precisou.
Foi sempre uma excrescência escandalosa
que se lhe dissesse como é infame a vida
que não vivamos para outrem nele.
E nunca, só de ser, disse a poesia uma outra coisa,
ainda quando finge que de sobreviver se faz a vida.

O mundo precisa de morte.

Não da morte com que assassina diariamente
quantos teimam em dizer-lhe da grandeza de estar vivo.

Nem da morte que o mata pouco a pouco,
e de que todos se livram no enterro dos outros.

Mas sim da morte que o mate
como um percevejo, uma pulga, um piolho, uma barata, um rato.

Ou que a bomba venha para estas culpas,
se foi para isso que fizemos filhos.

Há que fazer voltar à massa primitiva esta imundície.
E que, na torpitude de existir-se,
ao menos possa haver as alegrias ingênuas de todo o recomeço.

Que os sóis desabem.
Que as estrelas morram.
Que tudo recomece
desde quando a luz não fora ainda separada
às trevas do espaço sem matéria.
Nem havia um espírito flanando ocioso sobre as águas quietas,
que pudesse mentir-se olhando a criação.

(O mais seguro, porém, é não recomeçar.)

Jorge de Sena

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