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Música Brasileira

"Não é bom para o homem estar só mas ele está só, mesmo assim, ele espera e está só, ele adia e está só, só ele sabe que mesmo adiando chegará."
Natan Zach

segunda-feira, março 26, 2007

Edifício de Solidão

arac-a sOoL!!
"Súbito, nossas mãos se entrelaçam
para dar pouso aos pássaros da terra.

E vieram sombras conferir no asfalto
as impressões dos pés dos marginais.

E veio o vento do céu.
E veio a noite inspecionar
as lágrimas humanas.

E vieram os arquitetos
do silêncio construir seu edifício
de trevas e solidão."

Santo Souza

sexta-feira, março 23, 2007

Segunda Carta de Pero Vaz de Caminha,

... a El Rei,
Escrita da Novel Cidade de Brasília
com a data de
21 de Abril de 1960

indios brasileiros-amazonia-a sOoL!!
"Senhor:

Escrevo esta carta para vos dar conta dos sucessos da terra de Vera Cruz desde o dia de seu achamento até a construção desta Brasília onde agora me encontro. Eu a tenho, Senhor, por derradeiro feito e última louçania da gente de cepa e me empenharei em bem descrevê-la, nada pondo ou tirando para aformosear nem para enfear, mas só praticando do que vi, ouvi ou me pareceu.

O estar entre gentes que só têm olhos para o amanhã, em que o destino é feito todo dia e refeito ao amanhecer, talvez apicasse a veia profética que me pulsava em quinhentos. Serão augúrios, Senhor, nunca presságios, ou serão dificuldades de testemunhar veraz em terra que já não distingue o era do é e do será. Jardins vejo e me apontam que não passam de terra revolta, avenidas monumentais que são mais grama e macega e lagos portentosos onde a água’inda é bem pouca.

Este é um mundo todo novo em que pouco reconheço do que vi e experimentei outrora. Aquele que traçou Tordesilhas, repartindo a criação, hoje é pastor de ovelhas, contente do seu ofício. As nações são muito outras, tanto brigaram e depuraram que na verdade duas apenas restam da porfia. Uma assenta ao Nascente, a outra ao Ocidente, ambas as duas voltadas de costas disputando um rodeio de rojões. Os povos assuntam com cautela, por saber soltará o rojão mais medonho e nisto as duas muito se empenham.

Mas o ofício de escrivão é tratar do que vê , não do sente ou supõe. Portanto, do que hei de falar começo e digo:

Porque entre as gentes vejo uns quantos trigueiros que certamente têm os mais dos seus avós enterrados em África. Andam porém, tão indiferenciados entre todos, tão seguros de si e tão bem falantes de nossa língua que encanta vê-los, sobre tudo a elas. Têm feições bem tostadas, assim morenas, assim tisnadas, bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam lânguidas como se bailassem e com tanta graça natural que suponho não haja nesta terra maravilha que a elas se compare.

Creio mesmo que o feito maior da gente lusitana foi essa misturação de sangues, tanto pelo regalo que se houve em obrá-la como e principalmente pelas criaturas que gerou. Só elas, na verdade, perdoam sem haver gastado aquela indiana louçã que topei pelas costas nos idos de quinhentos louvei com tanto ardor.

Agora todas se cobrem de telas, mas com tal arte e malícia que mais despidas parecem. E se alguma cousa perderam da inocência com que d`antes se mostravam com as vergonhas tão nuas, muitos ganharam na desenvoltura e na graça que usam, agora, para, embuçando-as, mais a revelar.

É de vê-las, Senhor meu Rei, pela manhã quando acordam, ainda esgazeadas da noite. No correr do dia, gentis, luzindo em formosura, fazendo e desfazendo, falando ou caladas, sem nenhuma esquivança. E à noite, ó senhor meu Rei, à noite um homem carece de muita vergonha para conter se na lei divina e só cuidar da multiplicação.

brasilia-a sOoL!!
Se me alongo em matéria assim amena é porque muito me compenetro da devoção vossa feito pelos lusitanos e para que mais se avivente a memória de quanto desta fartura de graça se deve a Portugal E também porque entendo e quero se entenda o progresso que a criação, mercê de Deus, experimentou nesteS séculos. Por muito que puxe pela memória, recordando as raparigas do Porto e as de Lisboa, então aos meus olhos, força é convir que eram bem pouco diante dessas moças brasileiras. E aqui mesmo estão homens bons, maduros e velhos, sobretudo estes a testemunhar comovidos que de geração a geração mais elas se aldegaçam e mais graças acrescentam sobre o despotismo de graça que hão.

Já ninguém aqui se usa adereços de penas, nem quartejar o corpo com tinturas. Mas muita usança do gentio, em lugar de perecer como soía, por toda a terra se alastrou. Canudos esfumacentos que vi chupados por bruxos índios andam hoje na boca de homem e de mulher e todos rescendem à fumaça. As raízes que cuidei fossem inhames são muito cultivadas para delas se fazer uma farinha de pau que é o pão dos pobres. Dos mesmos índios tomaram variedades de plantas fruteiras e de grão, tralhas para todo uso e até muito nome bárbaro que usam entremeando na fala, pra desespero do meu entendimento.

Dos presságios que fiz em quinhentos, nenhum desmereceu.

Avezados no vinho, a ele tão bem se acostumaram que hoje machos e fêmeas se embriagam com muita porfia e deleite. A cordura que neles vi ainda sobeja, hoje como antes andam mui mansos e brandos.

Mas é de assinalar, como a obra mais de vantagem que nesta terra se logrou, o alargamento de nossa santa fé. Ninguém há pagão entre eles. Muitos são até crismados e os amásios, podendo, quase todos se casam. São contritos e mui devotos. Mas, senhor, este alargamento de fé fez com tamanha misturação de idolatrias d´África e abusões da terra que me enche o peito de piedade e mor espanto. Se este povo continua crescendo ao passo de agora, breve veremos em cruzadas a pregar pelo mundo todos os nomes santos-homens emparelhados com outros de mui baixa extração. Falsas santidades, antes desconhecidas, como esta tocante Iemanjá, combinação de Virgem, de santa e de sereia, trazem empós si, atadas, inteiras multidões, nas quais vejo, contristado, muitos veros lusitanos. Neste lago de Brasília, ainda nem bem formado, já os ritos de Iemanjá abalam as noites e nem eu, Senhor, padeço não vê-los, tanto encantam a olhos de velho navegador.

Toda a gente aqui tem por muito certo e provado ser esta Brasília o prodígio dos tempos. Para provar quanto siso tem este juízo devo contar a história de dois homens de gênio e de um herói que implantaram esta cidade no chão das coisas existentes.

O primeiro é Lúcio Costa, riscador de ofício e homem de muita arte. Segundo contam , cinco dias se fechou ele numa grota, em jejum de tudo, para esquecer todas as cidades jamais inventadas.

Cumprida a penitência, comprou por doze mil réis uma tira de papel e nela debuxou, displicente, a cidade que não era, nem se supunha .

E tão candidamente desvencilhou se que nuNca obra tão breve gerada a tantos a tão longamente ocupou e tanto ocupará.

O segundo gênio é um homem sagaz, um novo Israel, doutor em dinheiros. Muita lição têm seus serviços que não pode ser esquecido nesta crônica. Sua invenção maior, batizada NOVACAP, constituiu em tomar um, vasto chão despido de um tudo, tirá-lo a seus donos, por força da lei, em troca de trinta dinheiros, que era muito mais do que valia. Depois , declarando o mesmo chão assento de grande capital , passa a vender nesgas dele a preços de muita usura. Isto foi só o começo. Como as vendas tardassem e fossem a prestação, tendo a obra a construir e seu amo a resmungar. Israel se lança à façanha mais ousada. Faz-se homem de sindicâncias e logo descobre dívidas enormes que não se deviam, mas o governo é que devia. Endemoniado, sai no encalço dos credores, promete mui pronto pagamento aos juros daquelas dívidas todas desde que o dinheiro lhe dessem para as obras de Brasília. Troca, assim , o matreiro, dívidas velhas caducas por dívidas novas em flor.

Tudo somado, meu Rei, deu dinheirama tamanha que careceu fazer Israel um encanamento que da boca do tesouro desemboca na Brasília. Diante dessa chuva de ouro que cai de dia e de noite, nada são os por quintos que tantos nos amargaram. O que nos faltou na, verdade, foi um Israel como este, no tempo em que desmontávamos morrarias e esgravatávamos grupiaras por estes brasis afora. Sem suor, sem cativeiro, sem quintos e inconfidentes, Israel inventou a maior mina que neste país já houve, ganhou fama e será comendador, pois diz ventos que seu gênio custeou sem gastos para o orçamento, a construção dos palácios, das casas das ruas, das praças e de tudo que faz Brasília orgulho dos brasileiros.

Seria injusto esquecer que de tudo isso, o maior culpado é certo David Kubitschek, homem de muito engenho. Dele louvam feitos de tantos que me contentarei com a menor parte, só vos dizendo do que vi ou foi me contado .

Qual um segundo Golias, velho e descadeirado, ressonava este país, deitado na praia de Copacabana. Bem que tinha seu conforto, confiado que estava no provedor das vestes dos lírios, gozando os dengos de Gudin, a lhe catar os piolhos e o doca afago de Mc-Hower, a lhe fazer cafuné. Eis que surge o tal David, irmão de Macunaíma, sem pedras nem fundos, só armado de febre, a palavra fácil e um chuço de índio. Cutuca que cutuca, até o gigante virar. Agora, de costas para o mar-oceano, Golias boceja voltado para o mar do sertão. Qualquer nova cutucada o colocará sobre os pés e, então os quatro grandes mundos serão sete, dezessete ou nenhum.

O primeiro gesto de Golias em sua nova postura foi reclamar para pouso esta cidade impossível. Aqui a tenho agora, desdobrada neste campo palma, levemente ondulado, no planalto de Goiás. Por onde quer que me vire e só mataria meã e enfezada, todo ano corrida de fogo do campo.

É de vê-la, Senhor, no deserto em que foi plantada, como ilha perfeita no mar da miséria goiana. Bem sei quanta ousadia gastamos por este mundão afora e aqui mesmo quando edificamos a Bahia dos Santos e dos pecados, de casa voltada pr´África, a preterida cidade do Rio de Janeiro, a esquecida são Luiz do Maranhão, a combalida Nossa Senhora de Belém do Grão Pará, na boca do rio mar. Todas elas e muitas outras foram plantadas ali onde estão por um ato de vontade, mandando que fossem feitas para cumprir destino deliberado. Esta Brasília, porém, escapa às medidas de tudo que já foi feito. Nasceu madura, sisuda e monumental, embora também aprazível e até desvairada. E com a destinação ambiciosa de desenraizar esse Brasil da praia e mudá-lo para o sertão bruto.

Aqui tenho ao meu lado o mestre Lúcio Costa a explicá-la: sua forma é a de uma cruz assentada no chão. No topo, um terraplano triangular para ser a cabeça desta urbs e do país. É a praça dos Três Poderes. Nela se alevantam, altaneira, a casa em que se fará a lei e nos vértices opostos, acachapados, aquelas em que se dará cumprimento ou se combrará o descumprimento dela. Tudo feito a capricho para ter soberbia. Não se puseram bancos, nem encosto, nem adornos para que todos ali estejam sempre de pé, em prontidão, como convém.

Para dar um tom brasileiro a cenáculo assim solene, plantou-se um buritizal, proibindo-se, porém, a senadores gaúchos aí amarrar seus corcéis e a deputados cearenses entre os troncos estender suas redes. Tomou-se, também, o cuidado de, ao pé de arrimo, onde se estende larga campina, plantar grama intervalada de colonhão, para que pasto não falte, em caso de necessidade.

catedralbrasilia-a sOoL!!
Destacada, como convém a um quadro poder, se alça a catedral, excêntrica à Praça Maior. Não há como vos dar uma imagem dela, tão inusitado é o gosto e o capricho de Oscar, riscador de tudo de bom, e responsável por tudo de ruim que aqui se edificou. Deste homem tanto se houvera de falar que melhor é calados que ficarmos no coro e só dizer que, arquiteto do último Faraó, trabalhou pelo avesso, pois, em lugar de construir túmulos de reis, plantou aqui o futuro.

Mas voltemos à cruz. A seus pés, oposta à Praça dos Três Poderes, o juízo mandou botar, num largo, a polícia, os bombeiros e, sobretudo, um hospício espaçoso. Entre as duas praças, corre, obra de meia légua, a Avenida Monumental, aí desfilam hoje os ministérios e amanhã se enfilarão os bancos, o grande comércio e as casas de folgança.

Os arcos da cruz, seu tanto arqueados, formam o venam da cidade. Aí correrão, em louca disparada, veículos motores em pistas que, para nunca se entrecruzarem, englanam-se em laçadas francesas, investem no chão adentro ou saltam em pontes sobre o vazio. Ao longo desta azáfama, dispõem-se grandes quadrados, emoldurandos em cintas de arbustos que serão árvores amanhã. Dentro deles há de viver e morrer o comum da gente, engavetada em escaninhos suspensos, mas tendo por consolo o chão conquistado para espairecer sem temor dos monstros mecânicos.

Os burocratas infantes, com menos de sete anos, terão dentro das quadras arremedos de escolinhas para brincar com o tio Augusto Rodrigues. Os mais crescidinhos, a um passo da casa, quatro horas estudarão e mais quatro folgarão, atravessada uma alameda, numa escola-oficina-gandaia inventada por Anísio Teixeira para fabricar gente que melhor suporte e sustente o progresso do Brasil. Aos mais taludos, capazes de atravessar a rua dos loucos, prometem uma escola-escada, pela qual cada um há de subir segundo o peso de seu talento.

Devo dizer, Senhor, que a meu pesar, tudo isto, como o mais, são augúrios de momentos de muita fé.

De Brasília resta conta que é morada do Rei aqui chamado de Presidente, aquele que a si mesmo se escolhe para dirigir o país após, peleja e ganha dos outros que a si também se escolheram. Para conforto deste personagem, Oscar edificou um palácio de alvorada, tão improvável que apenas poisa no chão. É de tal forma inconsútir, airoso e etéreo que quem hoje o vê, cuida, amanhã, que sonhou. Para as abluções senhoris e outras conveniências, colocaram-se junto às alcovas uns quartos de mármores e ferros, com cisternas e borrigéis que já não se podem gastar, tanto é o povo que acorre, noite e dias a vê-los.

Esta é, Senhor, a cidade-máquina para os homens multidão deste século. Não cuidei que eles sejam de engonço, mas tanto diferem da gente do nosso tempo e tanto se obstinam neste descaminho que breve não nos terão por avós.

Ignoro como isto principiou. Suponho que sejam efeitos de umas bolandeiras de ferro que os ingleses inventaram. Tanto estas máquinas se multiplicaram, e com elas os homens, que hoje há enorme fartura de gente no mundo. É tanta e tão esganada que para sustetá-la a contento só entregando o serviço bruto à maquinaria. Para abrigar tanto povo as cidades incharam, o casario amontoou-se, casa por cima de casa, que hoje qualquer delas faz sombra à Torre de Belém.

Este Brasil, tão nosso no que fomos, fugiu quanto pôde a tamanha subversão. Mas a tempo vislumbrou que, crescendo seu povo um Portugal a cada ano, se continuasse contido no trabalho de duas mãos, breve teria apenas miséria pra dividr entre tantos. Chegara-se já a um ponto em que, com fartura, só havia mesmo gente de mui triste condição. Como este é artigo que americano não compra por dólar tratava-se de empregá-lo no enricamento do país. Serviço é que carecia, pois vaga mesmo só tinha na carreira de padre e justamente para isto o Criador mal dotou os brasileiros, gente de muita fé, mas de pouca compostura.

Daí foi que surgiu o tal David, Kubsticheck, pregador muito eloquente. Começou por dizer e fazer acreditar que de dias faria meses, de meses, anos inteiros, e que dinheiro fabricaria para encher todos os bolsos. Com tal afoiteza de fala, ainda maior de andarilho e muita malícia mineira, tirou deste povo o descanso. De suas obras muitas, só bem poucas posso aqui enumerar. O rio mais comprido desta terra, que se acabava em rego sestroso, ele inflou de áquas vivias e transmudou em estrada sem tamanho. Represou córregos e ribeirões, alagando mundões de terra, depois sangrou e o salto das águas fez trabalhar cativo para alumiar mil lugares e mover maquinaria. Forjou ferrou com modéstia porque mineiro não acredita nisto e por tamanha asneira tem sido muito xingado.

Mais grava é o que ele não fez, por puro temor de uma casta de maus donos que desgraça este país. Desde os ermos de Brasília e pra diante e pra trás há aqui terras sem dimensão, mas são todas possuidas de donos tão ciosos quão ociosos. Raros deles lavram as terras e uns poucos dizem que criam. Uns e outros mentem porque nunca quem lavra é o dono e os criadores daqui na verdade são é criados pelas alimárias do campo. Seu serviço consiste tão-só em colher o fruto, quando a chuva do céu engorda o pasto da terra e com ele suas boiadas.

Nesta terra de tal maneira graciosa que, querendo aproveitar, dar-se-á nela tudo, periga o povo padecer de muita fome por falta de um homem com disposição de recordar aos tais donos as condições em que tanta terra se deu. Os títulos de sesmaria e aqueles que elas geraram, entregavam terras para que se gastasse com suor próprio ou encomendado. Segundo a mim me parece, mas não ao tal David, Kubstschek, falta a este Brasil uma lei de muito arrôcho que aos donos detenha na figura de senhores das suas terras pelo muito que prezam aos títulos e porque este é o único modo porque sabem possuí-las. Mas com ordem mui severa de que nenhum destes donos possa ninguém obstar o uso das ditas terras que eles não queiram lavrar e que disto não poderão haver fruto algum.

Este David fez outras coisas tais e tantas, aos ricos tanto enricou, aos pobbres tanto empregou que, hoje, muito o querem pra Rei. Disto o Brasil está livre, diz lá ele, porque só tendo filha mulher e sabendo da ojeriza deste povo por genro, a tanto não se aventura.

Para não romper uma tradição, esta carta, como a primeira, encerra com um pedido, já não pra meu genro, Jorge d'Ósoiro, que no seu desterro é mortoenterrado e esquecido e talvez até perdoado de seus tantos pecados. Mas receberei com muita mercê de V. Majestade, se alguma cousa meus serviços vos merecem, a graça de intervir junto a J.K. para que a esta Brasília não se negue uma Universidade que seja nova como ela própria e capaz de difundir pelo Brasil o espírito inovador que presidiu sua construção. É pelos candangos que peço, no temor de que cresçam como boçais, e pelo Brasil que, depois de padecer tanto governo com mentalidade de asfalto, não merece sofrer outros tantos com mentalidade de capim. E também por Ciro dos Anjos, mortificado no temor de voltar, na velhice, às conversas belo-horizontinas, à porta da farmácia, sobre operações de apendicite pelo espiritismo.

Estes e maiores danos só se logrará evitar desatando-se a vontade daquele que fez Brasília, mas parece querê-la tacanha e incapaz de multiplicar-se por si mesma.

Desta cidade-capital, no mês de Abril do Ano da Graça de 1960, augura ao Rei Saúde e Fraternidade, o cidadão do Porto."

Pero Vaz de Caminha
- pela cópia, Darcy Ribeiro

quinta-feira, março 08, 2007

Rotação

Glow_II_by_Darkrose42-a sOoL!! "a esfera em torno de si mesma me ensina
a espera
a espera me ensina
a esperança
a esperança me ensina
uma nova espera
a nova espera me ensina de novo
a esperança na esfera
a esfera em torno de si mesma me ensina
a espera
a espera me ensina
a esperança
a esperança me ensina uma nova espera
a nova espera me ensina uma nova esperança
na esfera
a esfera em torno de si mesma me ensina
a espera
a espera me ensina
a esperança
a esperança me ensina uma nova espera
a nova espera me ensina
uma nova esperança
na esfera"

Cassiano Ricardo

sábado, março 03, 2007

O Poema do Semelhante

LilyaCorneli-a sOoL!!

"O Deus da parecença que nos costura em igualdade
que nos papel-carboniza em sentimento
que nos pluraliza
que nos banaliza por baixo e por dentro,
foi este Deus que deu destino aos meus versos,
foi Ele quem arrancou deles a roupa de indivíduo
e deu-lhes outra de indivíduo ainda maior,
embora mais justa.

Me assusta e acalma ser portadora de várias almas
de um só som comum eco
ser reverberante espelho,
semelhante ser a boca
ser a dona da palavra
sem dono de tanto dono que tem.

Esse Deus sabe que alguém é apenas o singular da palavra multidão...
É mundão...

todo mundo beija
todo mundo almeja
todo mundo deseja
todo mundo chora

alguns por dentro alguns por fora
alguém sempre chega alguém sempre demora.

O Deus que cuida do não-desperdício dos poetas
deu-me essa festa de similitude
bateu-me no peito do meu amigo
encostou-me a ele em atitude de verso beijo e umbigos,
extirpou de mim o exclusivo:

a solidão da bravura
a solidão do medo
a solidão da usura
a solidão da coragem
a solidão da bobagem
a solidão da virtude
a solidão da viagem
a solidão do erro
a solidão do sexo
a solidão do zelo
a solidão do nexo.

O Deus soprador de carmas deu de eu ser parecida

Aparecida

santa
puta
criança

deu de me fazer diferente
pra que eu provasse da alegria
de ser igual a toda gente

Esse Deus deu coletivo ao meu particular sem eu nem reclamar...
Foi Ele, o Deus da par-essência
O Deus da essência par.

Não fosse a inteligência da semelhança
seria só o meu amor
seria só a minha dor
bobinha e sem bonança
seria sozinha
minha esperança."

Elisa Lucinda